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Aspetos Financeiros

Mecanismos e Vias de Financiamento para Projetos CER

Como já foi mencionado, uma consideração fundamental ao analisar as opções de financiamento para a comunidade de energia é a forma como esta escolha tem impacto na propriedade do projeto, uma vez que pode influenciar a autonomia da comunidade de energia.

Por exemplo, numa comunidade de energia financiada a 100% pelos cidadãos ou financiada por um subsídio a fundo perdido, o controlo total de todos os ativos e decisões estratégicas cabe aos membros. Com o recurso a um empréstimo, por exemplo, verifica-se frequentemente uma diminuição do controlo ou da propriedade dos cidadãos, uma vez que as partes interessadas colocam as suas limitações e exigências.

Existem diferentes tipos e modelos para financiar comunidades de energia e iniciativas de projetos. Os tipos mais comuns são o financiamento por capitais próprios e o financiamento por dívida, mas existem também outras opções, como subvenções, donativos (incluindo “crowdfunding” e “crowdlending”) e até contribuições em géneros que podem contribuir grandemente para iniciativas de pequena escala.

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Visão geral

 Financiamento do capital próprioCréditoSubsídios e subvençõesDonativosContribuições em espécie
Quem pode investirCidadãos, municípios, PME,
Investidores Anjo (investidores iniciais)
Normalmente bancos e fundos, mas também cidadãos, municípios, cooperativas de ER e PMEAutoridades públicas, Programas da UE, Fundos nacionais, Fundações,  Fundos, Empresas, CidadãosEmpresas, Membros da comunidade,
Indivíduos, Entidades filantrópicas
Empresas, Membros da comunidade, Voluntariado
O investidor torna-se membroSimNãoNãoNãoNão
O investidor recebe de voltaUma parte do sucesso futuroRemuneração financeiraNadaNadaNada
PrósO controlo permanece na comunidade; Assegura o capital da comunidadeAcesso rápido a capitaisSem reembolso.
Pode ajudar a financiar a fase inicial.
Sem reembolso.
Bom para angariar pequenas quantidades.
Assistência gratuita.
Muito útil para projetos de energia comunitária.

    Os mecanismos de financiamento tradicionais, como o crédito, não estão frequentemente disponíveis ou não são adequados para o financiamento de projetos de CER. Os projetos comunitários de energia de pequena e média escala (menos de 1MW) podem geralmente atrair 100% de financiamento de investidores comunitários sob a forma de capital próprio.

    VERIFICAR:

    Financiamento de Capitais Próprios/Acções

    O financiamento com recurso a capitais próprios dos cidadãos é um mecanismo vital para financiar as comunidades de energia, particularmente no âmbito das cooperativas de energias renováveis (REScoops) na UE. Esta abordagem não só permite angariar o capital necessário, como também fomenta a apropriação comunitária e permite a participação direta das comunidades locais em projetos energéticos com impacto nas suas vidas.

    É aqui que o mecanismo de financiamento e o modelo de propriedade estão interligados:

    • Os membros financiam a comunidade ao comprarem ações (ou títulos de capital social), que constituem coletivamente o capital social da cooperativa.
    • Cada ação confere aos membros direitos de governação, dando-lhes direito de voto nas decisões da cooperativa. Num modelo cooperativo, cada membro tem direito a um voto, independentemente do número de ações detidas, assegurando processos de tomada de decisão democráticos e equitativos.
    • As ofertas de ações estão normalmente abertas a todos, dando prioridade aos habitantes locais da comunidade.
    • Os membros podem receber retornos do seu investimento que podem ir desde retornos financeiros, ações de energia ou outros benefícios sociais ou ambientais.
    • Os membros tornam-se utilizadores da cooperativa com o direito de beneficiar dos seus serviços.

    As Comunidades de Energia utilizam este mecanismo de diferentes formas. Algumas utilizam ofertas de ações específicas para recolher os fundos necessários para um projeto específico, enquanto outras optam por uma oferta de ações aberta em que os membros podem comprar ações a qualquer momento.

    EXEMPLO: O modelo de financiamento da Som Energia (Espanha) baseia-se principalmente no investimento dos membros na cooperativa através de 2 opções:
    • Compra de ações da cooperativa para se tornar membro (1 ação = 100 euros com dividendos de cerca de 3,5%). A Coopernico (Portugal) funciona segundo um modelo semelhante.
    • Compra de títulos de participação – investidos durante 5 anos para financiar novos projetos da cooperativa (com um retorno esperado do investimento de 4 a 7%).

    Crédito

    EMPRÉSTIMO BANCÁRIO TRADICIONAL

    Garantir um empréstimo bancário tradicional para um projeto comunitário de energia pode ser um desafio, particularmente no sul da Europa, uma vez que muitos bancos convencionais podem não ter experiência ou vontade de apoiar tais iniciativas, uma vez que estas podem revelar-se menos rentáveis. Os novos projetos sem um historial estabelecido enfrentam frequentemente dificuldades na obtenção de empréstimos junto dos bancos tradicionais. Mesmo que sejam bem sucedidos, os bancos financiam normalmente até uma percentagem dos custos do projeto, cabendo à comunidade assegurar o montante restante. Um empréstimo bancário tradicional requer garantias e implica o reembolso com juros ao longo do tempo.

    EMPRÉSTIMO BANCOS ÉTICOS OU COOPERATIVOS

    Estes bancos, frequentemente membros da Federação Europeia de Bancos Éticos e Alternativos (FEBEA), são normalmente mais favoráveis a projetos mais pequenos e estão alinhados com valores sociais, culturais e ecológicos. Ao contrário dos bancos tradicionais, evitam os investimentos no mercado financeiro e, em vez disso, concedem empréstimos exclusivamente a projetos economicamente viáveis no âmbito da economia social, como a agricultura biológica, a produção de energia renovável e as iniciativas culturais, estando normalmente estruturados como cooperativas.

    Os bancos éticos passam normalmente mais tempo com os gestores de projeto e estão mais atentos às necessidades dos projetos pequenos e cooperativos do que os bancos tradicionais. Embora não estejam envolvidos nos mercados financeiros, continuam a ser competitivos em relação aos bancos tradicionais. As taxas de juro são determinadas por factores como os rendimentos dos cooperantes, os custos do crédito e o risco, resultando normalmente em taxas de cerca de 4% a 5% para empréstimos com prazos de 10 a 15 anos. Ao contrário dos bancos tradicionais, os bancos éticos ou cooperativos não influenciam a governação do projeto. O seu papel está mais centrado no apoio a projetos que se alinham com a sua missão, em vez de exercerem controlo sobre eles.

    COOPERAÇÃO COM OUTRAS COMUNIDADES E COOPERATIVAS DE ENERGIA

    As REScoops existentes podem ajudar na criação de novas iniciativas apoiando financeiramente os primeiros estágios de desenvolvimento de novos projetos de REScoops, fornecendo um empréstimo com juros (mais baixos que os bancários) ou tornando-se acionista do projeto em desenvolvimento.

    EXEMPLO: Em Portugal, a Coopérnico, uma cooperativa de cidadãos para o financiamento de projetos de ET, oferece aos cidadãos e organizações oportunidades de investimento no setor das ER. Na sua génese esteve a necessidade de uma pequena empresa assegurar investimento para desenvolver 4 projetos fotovoltaicos antes que o prazo para a ter acesso à tarifa feed-in expirasse. A REScoop.eu comunicou esta iniciativa a diferentes REScoops na Europa convidando-as a investir. As REScoops que estavam interessadas nos projetos (Som Energia/ Ecopower/ Beauvent/ de Windvogel) decidiram entre si que seria contra seus princípios serem investidores estrangeiros sem dar aos cidadãos portugueses uma oportunidade de investir também. Assim, a Boa Energia, a empresa que iniciou o investimento concordou com a criação de uma REScoop local que foi denominada Coopernico. O consórcio criado concordou em comprar os projetos e tornar-se proprietária das instalações fotovoltaicas. A Coopérnico teria uma participação de 4% no consórcio com a possibilidade de comprar de volta até 100% das ações, quando a sua base de membros e capital social crescesse e, no final, acabasse por se tornar uma REScoop autónoma, o que acabou por acontecer.

    SUBSÍDIOS E SUBVENÇÕES

    O acesso a subsídios públicos e subvenções da UE ou nacionais pode ser útil nos processos de pré-conceção de projetos ou na criação de oportunidades e sinergias para o intercâmbio.

    SUBVENÇÕES

    As candidaturas a financiamentos públicos podem ser uma forma de financiar o teu projeto comunitário de energia, especialmente na fase inicial. Eis como abordar esta opção de financiamento:

    • Explorar as subvenções disponíveis: Investiga as subvenções oferecidas a nível nacional ou regional. Muitos países da UE oferecem subsídios para o desenvolvimento comunitário através de programas governamentais, que podem ajudar a cobrir os custos iniciais do projeto.
    • Preparar o pedido: A maioria dos pedidos de subsídio exige a apresentação dos estatutos oficiais ou da declaração de missão do teu grupo. Também é necessário definir claramente os objetivos e a forma como o dinheiro do subsídio será utilizado para os alcançar.
    • Procurar feedback: Se és novo na redação de pedidos de subsídio, procura aconselhamento junto de pessoas da tua comunidade que tenham experiência neste processo. Elas podem fornecer feedback valioso para fortalecer o teu pedido.
    • Perseverar perante a rejeição: Se a sua primeira candidatura não for bem sucedida, não desanimes. Utiliza o feedback para melhorar a tua proposta e fica preparado para a voltar a apresentar numa nova oportunidade.

    FINANCIAMENTO DA UE

    Os fundos europeus nem sempre são adequados para projetos pequenos e locais. Mas podem ser opções de financiamento muito interessantes no caso de uma agregação de projetos ou se for adoptada uma abordagem particularmente inovadora. A Comissão Europeia está a gerir vários regimes de financiamento e de concessão de subsídios em toda a Europa. Estes regimes de financiamento têm metas, objetivos e procedimentos de candidatura diferentes. A lista completa pode ser consultada aqui.

    Alguns programas de financiamento de interesse podem ser os seguintes:

    • Horizonte Europa: Um programa da Comissão Europeia centrado na investigação. As Comunidades de Energia podem participar em projetos e tecnologias inovadores. A taxa de cofinanciamento é elevada.
    • Programa LIFE: Reforço das capacidades e demonstração em vários temas relacionados com o ambiente e o clima. O programa LIFE ocupa um lugar de destaque no desenvolvimento de projetos de base cidadã e territorial. A taxa de cofinanciamento é bastante baixa.
    • INTERREG: Programa europeu gerido em regiões da Europa. Centra-se geralmente nas autoridades locais e nas regiões. Apoia o desenvolvimento de um projeto local que terá um forte impacto nos municípios e na coesão territorial. O processo de candidatura é um pouco mais ligeiro e mais apoiado pelos secretariados regionais, mas a taxa de cofinanciamento é inferior à do LIFE.
    • Erasmus+: Centra-se na formação e no desenvolvimento de indivíduos e organizações. Financia uma vasta gama de atividades de reforço de capacidades, incluindo iniciativas relacionadas com a formação em matéria de clima e ambiente. Uma oportunidade de financiamento mais pequena que pode ser muito útil para apoiar o desenvolvimento da construção de comunidades. Em geral, o processo de candidatura é simplificado para uma organização mais pequena pelo secretariado nacional que apoia o desenvolvimento da proposta.
    • CCI Clima: Programa de financiamento centrado no apoio a iniciativas climáticas favoráveis às empresas. A Comunidade de Conhecimento e Inovação (CCI) está a nascer do IET (Instituto Europeu de Tecnologia) para apoiar a inovação, criar capacidades e investir em iniciativas empresariais com impacto. As subvenções da CCI Clima são mais pequenas do que os programas tradicionais de financiamento da inovação, mas proporcionam um grande apoio e acompanhamento ao longo do desenvolvimento do projeto. Os secretariados nacionais estão a apoiar as organizações na apresentação de propostas e o programa tem uma boa taxa de cofinanciamento.
    • NESOI (European Island Facility): Apoiado pela Direção da Energia da Comissão Europeia. Este consórcio europeu está a abrir concursos para apoiar 60 ilhas europeias, ao longo de uma série de convites abertos à apresentação de projetos. As comunidades insulares beneficiarão de formação técnica e de apoio financeiro.

    FINANCIAMENTO NACIONAL

    A maioria dos Estados-Membros dispõe de subvenções e apoios destinados ao desenvolvimento de projetos de energias renováveis. Podes obter muitas informações consultando a tua agência nacional de desenvolvimento, o teu ministério da energia ou a tua agência nacional de energia.

    FINANCIAMENTO MUNICIPAL

    Os subsídios municipais são a melhor e mais simples forma de dar início a um projeto comunitário. O município local é o melhor e o primeiro parceiro de um grupo de cidadãos que pretende lançar um novo projeto de energias renováveis. Em muitos Estados-Membros, muitos regimes de apoio dependem dos municípios para serem implementados.

    Não esquecer que:

    • As comunidades de energia partilham frequentemente objetivos políticos em torno da ação climática adotada pelos municípios. Neste caso, o município pode dar apoio, visibilidade e, por vezes, reforço de capacidades ou pequenas subvenções à comunidade de energias renováveis que está a começar.
    • Os municípios podem ser parceiros em projetos locais juntamente com uma comunidade de energia. Neste cenário, duas entidades distintas investem conjuntamente, e os fundos públicos são afetados por um veículo de investimento conjunto.
    • Os municípios podem participar numa comunidade de energia tornando-se membros ou disponibilizando o espaço físico para o sistema de ER.

    Donativos

    O financiamento coletivo (crowdfunding) é outra opção para as comunidades de energia recolherem fundos. Trata-se de uma forma de “crowdsource” de dinheiro para financiar projetos através de convites abertos ao público em geral, normalmente através de plataformas online. Estabelece uma ligação direta entre as comunidades que necessitam de financiamento e os contribuintes que querem apoiar financeiramente a visão e os objetivos do projeto.

    Normalmente, as campanhas de financiamento coletivo duram um período específico e limitado em que são recolhidas pequenas contribuições individuais de um grande número de pessoas. Estes projetos têm normalmente objetivos de financiamento relativamente pequenos (há algumas excepções) e os fundos são angariados para uma utilização específica. No final da campanha de crowdfunding e dependendo do acordo pré-estabelecido, os proprietários do projeto podem ficar com qualquer montante que tenha sido oferecido ou ficar com o dinheiro apenas se o montante-alvo pré-definido tiver sido atingido.

    Estas campanhas podem basear-se exclusivamente em donativos ou até oferecer recompensas em troca de contribuições. Estas recompensas podem incluir produtos ou serviços normalmente de valor mais baixo, simples menções ou outras ideias que os beneficiários da campanha possam apoiar.

    Várias plataformas podem acolher a atividade de financiamento coletivo de uma comunidade de energia. Para encontrar uma que te convenha, podes considerar o seguinte:

    • Especificidades das plataformas: Algumas plataformas são especializadas em tipos de projetos.
    • Popularidade à escala necessária: É importante encontrar plataformas que tenham o número máximo de utilizadores com base no âmbito geográfico pretendido pelo projeto (regional, nacional, europeu).
    • Taxas e regimes de remuneração: É sempre necessário conhecer as taxas da plataforma (as mais comuns são as fixas ou as de comissão).
    • Regras e regulamentos nacionais: Muitos Estados-Membros adotaram regras rigorosas para proteger os investidores privados.
    • Sede: Se o dinheiro está a viajar e onde é armazenado pela plataforma são critérios a considerar ao escolher uma plataforma segura.
    • Caraterísticas: considera as várias caraterísticas de que necessitarás para realizar uma campanha de angariação de fundos bem sucedida.

    Uma alternativa consiste em obter também o financiamento da dívida junto de particulares. É o chamado crowdlending.

    No crowdlending (empréstimos entre pares), vários investidores privados emprestam dinheiro com o entendimento de que o dinheiro será reembolsado com juros. O crowdlending é uma forma de receber empréstimos individuais dos cidadãos. Todos esses microempréstimos individuais resultam numa soma maior.
    Tal como no caso do “financiamento da dívida”, existem juros e riscos, pelo que deve ser sempre claro ao comunicar qual será o impacto do fracasso do projeto no investimento do indivíduo.

    EXEMPLOS

    Práticas de cooperativas que criaram as suas plataformas de crowdfunding / crowdlending:

    HYPERION (Grécia) financiou o seu projeto principalmente através da participação de capital dos seus membros, mas também organizou uma pequena campanha de crowdfunding para subsidiar os custos de adesão de alguns agregados familiares pobres em energia. A campanha de crowdfunding foi organizada utilizando a plataforma de investimento coletivo Genervest para conceder microempréstimos a juros baixos a alguns dos membros.

    A campanha de financiamento coletivo foi organizada em coordenação com a Genervest e a Greenpeace Grécia, que ajudaram a divulgar o projeto nos meios de comunicação social. Os membros foram profundamente envolvidos na análise dos benefícios (e custos) de receber um empréstimo e, durante a Assembleia Geral, concordaram em avançar com um voto positivo. Genervest.org – permite investimentos de micro e média dimensão em projetos de energias renováveis que tenham também algum tipo de impacto social, por exemplo, comunidades de energia.

    ZEZ (Croácia) apoiou várias campanhas de financiamento coletivo:
    • Escola independente de energia Kaštel Lukšić (financiamento coletivo baseado em donativos)
    • Investimento em duas centrais de energia solar na cidade de Križevci (financiamento coletivo baseado em recompensas)
    • Solarna Pecka (financiamento coletivo com base em donativos)
    O financiamento coletivo foi organizado através do Indiegogo e do ZEZinvest.

    COOPERNICO (Portugal) criou uma plataforma de crowdlending para financiar os seus projetos de energias renováveis. A plataforma está aberta apenas aos membros da cooperativa. Os membros estão a emprestar fundos à cooperativa para desenvolver e instalar produção solar em grandes telhados e estão a obter taxas de juro de 3-4% sobre os seus investimentos através da plataforma.

    VERIFICAR algumas plataformas de Crowdlending:

    VERIFICAR algumas plataformas de Crowdfunding: